Eu sempre soube que seria desenhista. Desde criança. E até hoje preencho as papeladas burocráticas com "desenhista industrial" com muito carinho e um certo orgulho.
Essa certeza nasceu na infância, lá em meados dos anos 90, quando eu podia ficar o dia inteiro desenhando e não tinha grandes preocupações. Se estivesse sol, a brincadeira era no quintal, e eu aproveitava para usar meu jogo de panelinhas cor-de-rosa e cozinhar matinhos. Até hoje me amarro em cozinhar, e, penso nisso como um plano B. Se estivesse chovendo ou frio, a brincadeira era dentro de casa, e, quando acabava o horário de desenhos na TV, (sim, caro leitor, os anos 90 proporcionaram essa experiência No On-demand) eu podia me deleitar com uma caixa de lápis de cor e um caderno de desenhos que sempre me eram fornecidos. Obrigada, Pai e Mãe <3.
Inicialmente, como toda criança, muitos rabiscos; depois, cópias, e, como evolução natural, criações próprias!
Acervo pessoal
Com o passar do tempo e um pouco de bom senso e noção estética, logo vi que não daria para continuar o legado do Maurício de Sousa. Eu teria que encontrar o meu próprio caminho. Eu compreendo que desenho é técnica e como toda técnica deve ser treinada e pode ser aperfeiçoada. Mas havia uma intuição ali. Hoje eu valorizo a prática que leva a perfeição, mas essa intuição estava ligada a outras coisas que farão total sentido no futuro, prometo.
O tempo passou e continuei com aquilo em mente, de alguma forma. Sempre lendo, estudando, "curiando"… As aulas de educação artística eram sempre as mais aguardadas! Lembro de um ano em que tínhamos até um mini ateliê na escola! Era fantástico. Aquela sala especial, simples, mas que já possuía mesas de trabalho em grupo. Mais tarde, na faculdade, fui descobrir que aquele era o conceito das aulas da Bauhaus, um espaço multidisciplinar! Ah! Nada mais design do que um espaço como esse. Mas até esse momento, eram apenas aulas de arte. Desenhos, pinturas, experimentos, padrões, colagens… Tudo no campo das artes visuais.
No ano de 2007, por volta dos 15 anos, rumo à última fase do colegial (ainda se chama assim?), começava uma caminhada de 3 anos até o vestibular. Era um ótimo momento para pensar em carreira, ENEM, cursinhos preparatórios, a possibilidade de fazer um colegial técnico, talvez? Já sair com uma profissão? Ou talvez fazer um curso profissionalizante extra? Enfim, muitas possibilidades. E muitas dúvidas na cabeça dos meus amigos, que ainda sentiam certa dificuldade em escolher o que, naquela época, pensávamos ser a escolha de nossas vidas. Na minha turma e entre meus amigos, posso dizer que teve de tudo: de ator a modelo, passando por contabilidade, publicidade e cantor, sem deixar de lado as clássicas: arquitetura, engenharia e odontologia.
Vindos de escola pública, não éramos pressionados para promover o nome da escola. Poderíamos ser o que quiséssemos e nossos pais nos incentivassem.
Em casa, a única recomendação era escolher algo de que eu gostasse, pois filha de ex-metalúrgico e taxista, com ex-trabalhadora doméstica e dona de casa, já era posto que trabalhar incansavelmente seria o meu destino. Nunca fui pressionada para, nesse campo da carreira, ser isso ou aquilo. Foi um lugar onde sempre tive paz, acolhimento e segurança.
Durante esses 3 anos de colegial, me debrucei sobre Guias do Estudante da Editora Abril, editais do Liceu, propostas de cursos do Senai e várias grades de diversas faculdades. Descobri então um curso chamado Desenho Industrial e outros semelhantes de Comunicação Visual. A descrição era maravilhosa: desenhar coisas. Desenhar o mundo, desenhar objetos para serem fabricados em escala industrial. Me parecia o céu! Aquelas palavras se comunicavam tanto com a criança que eu fui um dia quanto com a minha vontade interior de botar um pouco de ordem no mundo. Aqui cabe compartilhar um pouco da minha personalidade: Eu sempre fui diferente. E talvez isso não seja um exagero afirmar, quando olho para trás. Eu sempre fui uma pessoa diferente e isso não significa que eu era melhor ou pior do que as outras pessoas. Eu apenas não era igual às minhas primas, a minha mãe não era como as mães das minhas amigas, eu não encontrava muito eco nas causas que eu defendia ao longo da minha vida - que geralmente envolvia um perfeccionismo e um valor agregado. Isso não quer dizer que eu fui uma criança ou uma adolescente sozinha. Não, eu sempre tive muitos amigos, sempre muito diferentes entre si, o que me proporcionou um vasto conhecimento de "Como pode ser diferente?" (em breve em um texto por aqui).
Mas, de alguma forma, talvez eu soubesse secretamente que aquele AINDA não era o meu lugar no mundo. Eu segui em frente pelos anos, liderando quem eu conseguia, levando um pouco da minha ainda pequena visão de mundo para com quem cruzei, e assim trilhei meu caminho.
Durante esse tempo, eu descobri que existia uma profissão para exercer o que eu vinha fazendo nas minhas agendas durante os últimos anos e amando: Design Editorial!
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Sim! Alguém era pago para fazer aquelas ilustrações, fotos, compor as chamadas das matérias, contar aquela história de um jeito bonito, que fazia com que a gente comprasse e consumisse revistas. Ah! Bons tempos! (Sim, eu estou consciente dos problemas da época e do massacre que foi a falta de representatividade, entre outras questões, mas me refiro ao ritual que era comprar a revista na banca e ter um momento com ela: folheando, lendo, fazendo os testes, folheando novamente - dessa vez de trás pra frente, emprestando para as amigas, e, quando finalmente ela já estava "obsoleta", removíamos os pôsteres e destinava-os as pastas de bandas e recortávamos as figuras para ilustrações de diários - minha parte favorita).
E assim foi. Simples. Durante minhas pesquisas, descobri onde os cursos eram oferecidos, ficava tentando pegar experiências e depoimentos de alunos em blogs e fóruns de estudos na internet, no extinto Orkut e nos sites das instituições. Em 2007-2009, ainda não tínhamos a quantidade de conteúdo que temos hoje de vídeo-aulas e cursos grátis no YouTube. Os tutoriais não eram mais do que passo-a-passo que precisávamos baixar em PDF, e raramente conseguíamos ver algum vídeo da coisa acontecendo em sequência, ao vivo. Buscava entender como seria de fato o cotidiano das aulas e da profissão. Outro ponto da pesquisa era a diferença entre as grades e, principalmente, o preço. Toda a faculdade seria paga com os meus próprios esforços, e meus pais me ajudariam com o restante. Então, no último ano, 2009, entrei em um desses cursos que ensinam a mexer nos softwares gráficos, pago pelos meus pais, que me levou a encontrar no mural de vagas da escola, meu primeiro emprego na área, no finalzinho do ensino médio, que envolvia um pouquinho de criação e um pouco de arte-final simples. Assim, já consegui recursos para complementar a bolsa de estudos e prestei vestibular para a Universidade de Guarulhos! Minha cidade!
Todos os cursos relacionados a design tinham um alto valor de investimento. Na minha faculdade mesmo, que não era das mais absurdas, apenas o curso de Odonto tinha uma mensalidade mais cara na época. Acredito que essa posição de ser um curso elitista é algo perpetuado até os dias de hoje. Os materiais são caros e desenvolver um repertório exige aprimoramento constante.
2010! Primeiro dia de aula! Eu me lembro exatamente da roupa que eu usava, em uma típica noite de verão! Era a primeira vez em que eu estudaria à noite!
Eu me lembro com enorme carinho dessa época. Foram 3 anos e meio de curso, onde tudo fluiu. Finalmente, eu encontrei a minha galera! A conexão foi tão mágica que, desde o segundo trabalho, nos olhamos, entendemos que formaríamos um bom time e seguimos unidos até o final. Naquelas aulas, aprendi conceitos técnicos. Nos corredores, aprendi o valor do networking. Ali, naqueles prédios imensos, me tornei um pouco mais adulta, me aproximei mais da ideia de que era possível sim, mudar alguma coisa, para tornar o mundo mais bonito, mais acessível, mais bem diagramado para cada pessoa. Design é sempre para pessoas. E sempre estamos nos perguntando: Como isso pode ser melhor?
Meu TCC é, até hoje, o trabalho do qual mais me orgulho.
Nesses anos, encontrei quem estava disposto a desenhar um mundo novo e diferente. A forma como eu enxergava a vida era, em grande parte, a forma como essas pessoas enxergavam a vida também, e isso dava um baita senso de pertencimento. É muito bom se sentir amado e acolhido.
Isso não é uma monografia, mas jamais poderia seguir sem agradecer aos meus amigos de inúmeros trabalhos: Marcelo, Adriel, Simone, Guilherme e Brunno. Aos colegas: Ágatha, Daiane, Lidiane, Tatiane e Guilherme. E aos meus mentores Júlio e Manuel, Môa, Bruno, Alexandre, Sérgio e Alzira. Vocês fizeram parte desse pedaço incrível da minha vida.
Quando me formei, em julho de 2013, comecei a mandar currículos para toda a cidade de São Paulo em busca de um novo emprego! Afinal, agora eu estava liberta de uma dívida e pronta para me jogar nesse mundo profissional real oficial.
A caminhada de um recém-formado em busca de trabalho é algo desafiador. Muita vontade, pouca experiência e vivência nesse mundo vasto de marcas e projetos enormes. Meu primeiro emprego me ensinou a trabalhar: saber lidar com uma rotina, com pessoas, com situações de escritório, sobre alguns processos de fabricação... Mas pouca coisa sobre design de fato. Às vezes duplando, às vezes sozinha, não tive a oportunidade de ter mentores e alguém que me desenvolvesse.
Em um dos 100 e-mails e candidaturas que enviei, ao longo de 3 meses, lembro claramente de um anúncio que pedia para responder um questionário próprio. Pensei: "Poxa, não basta o currículo? Ainda tenho que fazer o cadastro deles?" Bom, já que estou na chuva, que seja para me molhar! E lá fui eu responder as perguntas da tal agência. Já havia visto alguns trabalhos deles, pois eram icônicos. Formulário enviado, em pouco tempo, um retorno por e-mail. Opa! Algumas trocas de e-mails com o coordenador da área sobre minha (in)experiência com embalagens e consegui o convite para a entrevista presencial. A primeira, de três encontros. Algumas coisas me impressionaram nessas visitas. Primeiro: eles não só leram, como imprimiram meu questionário. Conversei inicialmente com os dois coordenadores da época. Segundo: o lugar era de silêncio e paz. Acredito verdadeiramente que coisas boas moram nesses ambientes calmos. É algo bem surreal para quem vinha de uma fábrica barulhenta. A conversa foi muito mais para me conhecer do que sobre habilidades muito técnicas. Mais uma vez, me senti aceita como eu sou e sobre o que eu tinha a oferecer, porque consegui passar para a segunda fase, onde conversei com o diretor da área, que dedicou o seu tempo para me falar sobre como seria uma longa trajetória até chegar em algum lugar. Na hora não entendi bem, mas nos meses seguintes isso fez muito sentido.
Consegui um passe verde e segui para a última etapa: um teste presencial. O primeiro encontro com o computador da maçãzinha. Gente… Fiz o que deu… que não foi muito, mas o suficiente para receber a ligação no final daquele dia, me convidando para integrar a equipe. No momento da ligação, já estava pronta para o SIM, e para finalmente me lançar no fantástico mundo das agências e tudo o que vem à nossa cabeça com aquele imaginário.
Na minha mente, eu imaginava que conseguiria segurar a onda por um ano e depois migrar novamente para outro lugar. Mas ainda bem que, com pouco tempo, vi que agências de design eram bem diferentes de agências de publicidade. Até hoje, a risca no chão entre design e publicidade, entre designers e publicitários, está sempre bem nítida.
Em uma semana dei adeus ao meu velho trabalho e iniciei a vida nova! Era como o sentimento da faculdade novamente!
Por uma semana.
Continua na próxima edição.
Confete: coisas boas a gente espalha!
Um livro: Mil-milhas, Tamara-Klink
Como essa primeira edição é sobre crescer e se aventurar no mundo, recomendo a leitura de Tamara Klink. Um relato poético sobre sua jornada para realizar a sua primeira viagem em solitário.
Um assunto: chegou em um ambiente novo e precisa quebrar o gelo? A Plau deu a letra aqui, passo a passo sobre como desenrolar uma conversa original sobre tipografia e socializar com qualquer pessoa. Pode confiar que é sucesso!
Obrigada por ficar até o final! Até a próxima edição!
☝🏻 Este texto foi co-criado com a ajuda de IA e olhar humano, para revisar o encadeamento das ideias, revisar gramática e ortografia.
Amei os desenhos da mini Tha 🥰 e queria te parabenizar pela iniciativa, te admiro por sempre se desafiar e estar em movimento! obrigada por iniciar esse projeto e compartilhar tantas reflexões pertinentes, com ctz isso tudo não deveria ficar guardado… que bom que agora é real, se materializou! Que nos momentos desafiadores vc releia os textos que vão estar por aqui e consiga enxergar o qto vc é inspiração! 👏🏻✨ #sósucesso